Para Fernando Pessoa, um poema "é um produto intelectual"e, por isso, não acontece no momento da emoção, mas resulta da sua recordação. A emoção precisa de existir intelectualmente, o que só na recordação é possível. Há uma necessidade da intelectualização da emoção para exprimir a arte. Ao não ser um produto directo da emoção, mas uma construção mental, a criação de um poema confunde-se com um fingimento.
Não há propriamente uma rejeição da sinceridade de sentimentos do eu individualizado e real do poeta, mas interessa-lhe a capacidade do eu poético em estabelecer novas relações do Ser com o Mundo e de dizer o que efectiva e intelectualmente sente. O fingimento apenas implica o trabalho de representar, de exprimir intelectualmente as emoções ou o que quer representar.
A crítica da sinceridade ou teoria do fingimento está bem patente na dialéctica da sinceridade/fingimento que se liga à da consciência/inconsciência e do sentir/pensar e que leva Pessoa a afirmar que "fingir é conhecer-se". O poeta considera que a criação artística implica a concepção de novas relações significativas, graças à distanciação que faz do real, o que pode ser entendido como um acto de fingimento ou mentira.
A poesia do ortónimo revela a despersonalização do poeta fingidor que fala e que se identifica com a própria criação poética, como impõe a modernidade. O poeta, por vezes, recorre à ironia para pôr em causa, inclusive a própria sinceridade que, com o fingimento, possibilita a construção da arte. Fingir é inventar, elaborar mentalmente conceitos que exprimem as emoções.
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