segunda-feira, 2 de novembro de 2009

A Milton de Aguiar A gripe

Curtes aí no leito a mais aborrecida
Doença que há na vida:
A gripe maçadora:
A penca a pingar, dorida, inflamada;
Rubra a garganta, a cabeça pesada,
Espilros e tosse esfaceladora.

Deves sofrer porém tudo isso alegremente,
Seres feliz na dor.
Porque tu, Milton, és incontestavelmente,
No meio do defluxo, a vítima do amor!

Do amor, da arte divina,
Da arte suprema e bela
Que nada pode igualar...
És a vítima da TINA,
Somente por causa dela
Estás aí a espilrar!...

Não deves pois sofrer, gozar deves até.
Não se sofre por uma mulher linda,
Assim como essa é.
A dor que ela nos causa, uma ventura infinda
À nossa alma dá:
É um sofrer delicioso,
É um sofrer voluptuoso
Como no mundo outro não há!...

Não te lamento, invejo-te - acredita -,
Não vou saber de ti pra não te despertar
Do sonho em que tu vês essa mulher bendita
Que te fez constipar.

Sem nada mais dizer, desculpa se te maço
Com esta versalhada.
Adeus até breve. Isso não é nada.
Aceita um grande abraço.

Mário de Sá-Carneiro

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